Novos áudios e vídeos obtidos com exclusividade pela TV Cidade Verde revelam como agiam servidores do Departamento Estadual de Trânsito do Piauí (Detran-PI) e funcionários de autoescolas para fraudar o exame prático da Carteira Nacional de Habilitação (CNH).
Durante o Jornal do Piauí desta sexta-feira (29), o delegado Roni Rocha deu mais detalhes sobre o funcionamento do esquema de corrupção, alvo de uma operação da Polícia Civil (PC-PI) que resultou na prisão de 17 pessoas e na apreensão de dez veículos.
Conforme a autoridade policial, a investigação identificou que instrutores e o proprietário de uma autoescola “recrutavam” os alunos durante as aulas práticas e negociavam o pagamento de até R$ 600 a examinadores do Detran-PI que facilitariam a aprovação no momento da prova. Em áudios, obtidos pela Polícia Civil após a quebra do sigilo telemático dos investigados, uma das instrutoras presas na operação dá orientações de como o aluno deveria agir no momento do exame. Confira:
“O examinador não vai poder falar nada contigo sobre o assunto. Eu vou passar o dinheiro para ele, certo, eles vão facilitar, mas assim, tu vai ter que fazer tudo bonitinho, procurar pelo menos não estancar o carro. Ele vai ficar falando: a seta, dobra a direita. Só que ele vai ficar falando baixo, porque ele não pode falar alto por conta que o carro é cheio de câmera. E outra coisa, no carro tem um tablet, que é coligado ao carro. Se você estancar, eles não vão poder fazer muita coisa por ti, pois então procura pelo menos não estancar o carro”, explica a instrutora investigada.
Em outro trecho, a instrutora reforça as orientações e ressalta a possibilidade de estorno do dinheiro pago caso o aluno não consiga a aprovação.
“Caso você não passe, que Deus me livre, que tu vai passar, o que acontece, eles vão me devolver o dinheiro e eu vou te devolver o dinheiro. Caso você passe na baliza e fique no percurso, aí é a metade, eles devolvem a metade do dinheiro. É dessa forma, mas você não vai poder falar nada desse assunto, poque não pode, se não vai dar uma confusão muito grande, dá até processo. Então caladinho”, reforça.
O delegado explica que o cuidado de como o aluno deveria agir leva em conta o sistema de telemetria e de georreferenciamento do veículo usado no exame, que realiza o registro de áudio, vídeo e de todo o percurso. Uma gravação obtida pelos investigadores também mostra a participação dos chamados “despachantes” no esquema. Nas imagens, um homem identificado como Santa Inês, em referência a sua cidade natal no Maranhão, se aproxima de um carro com duas instrutoras do Detran-PI.
Ao analisar o material, a polícia conseguiu identificar padrões que apontam para possíveis irregularidades.
“Nossos agentes acompanharam durante alguns dias e viram como era o modus operandi. Percebemos uma ação completamente dissimulada. O indivíduo está parado e quando percebe o veículo que ele tem intenção de se comunicar com os examinadores, ele começa a andar no mesmo sentido. Quando se aproxima, a examinadora coloca o braço para fora para receber o objeto. Ele discretamente passa e faz um sinal para outro funcionário do Detran, que está dirigindo um ônibus, e segue o caminho”, comenta Roni Rocha.
Após a prisão de servidores do Detran, instrutores e o proprietário de uma autoescola, a investigação não descarta ações contra alunos que também participaram do esquema.
“Quem pagou está envolvido em esquema de corrupção. Vamos dialogar com o Detran para verificar a questão da CNH dessas pessoas. Quem deveria ter sido reprovado e não foi, vamos pedir uma reanálise do vídeo daqueles alunos que estão envolvidos com esquema de pagamento”, concluiu o delegado.
As investigações da Operação Cribelo tiveram início após o Departamento Estadual de Trânsito do Piauí (Detran-PI) implementar um novo sistema de monitoramento em veículos. Ao todo, 6 examinadores do órgão foram presos temporariamente por envolvimento no esquema de corrupção que ocorria durante a prova prática de alunos que buscavam a Carteira Nacional de Habilitação (CNH).
De acordo com a diretora-geral do Detran, Luana Barradas, no segundo semestre de 2023 foi implantado um sistema de monitoramento nos carros. Esse sistema permitiu que o esquema de corrupção fosse revelado.
“Hoje no Detran, na parte do exame prático todos os nossos carros eles são equipados com microfones e câmeras no qual a gente tem um monitoramento de tudo que ocorre dentro do âmbito do exame prático. Então desde que o aluno e examinador entram no carro existe uma telemetria para confirmar se são os dois dentro do percurso e temos um tablete que acompanha todos as faltas dos examinadores e tudo é gravado em vídeo e áudio”, explica.
Após as gravações, uma comissão analisava os vídeos e caso encontrassem inconsistências, a comissão fazia o alerta. Após constatar as irregularidades, o Detran encaminhou o caso a Polícia Civil que deu início as investigações.
Fonte: Cidade Verde